SAÚDE E  ECONOMIA

Artigo publicado em 27.02.2003 no Monitor Mercantil.          

Prof. Marcos Coimbra

Professor Titular de Economia junto à Universidade Candido Mendes, Professor Na UERJ e Conselheiro da ESG.

              Os países mais desenvolvidos, na década de 50, aplicavam em gastos com assistência à saúde cerca de 3% do PIB. Agora,  alguns desses países têm 16 % de seu PIB  investidos em  assistência à saúde. E isto considerando-se ter havido a progressiva desaceleração do crescimento populacional nesses mesmos países. Nosso sistema de saúde possui vários paradoxos. O primeiro, gerencial: improvisam-se gerentes para decidir em organizações complexas, do posto de saúde ao ministério da Saúde. O segundo, organizacional: descentralização centralizante, com o espectro do INAMPS renascendo nas secretarias estaduais ou municipais de saúde. O terceiro, econômico: carência de recursos em paralelo a enormes desperdícios. Falta de pessoal, com profissionais desmotivados, descomprometidos. Falta de recursos materiais ou financeiros com desvios e desperdícios. O quarto, assistencial: resolutividade do ato médico entendido apenas nos estágios avançados de organização da saúde. Não existe promoção da saúde e a prevenção está reduzida à vacinação. O diagnóstico e tratamento constituem a verdadeira medicina, praticada nas enfermarias, nas UTIs e no Centro Cirúrgico. A reabilitação é desprezada.

              O  Brasil aplica só cerca de 2% do PIB em assistência à saúde. A nossa Constituição prescreve que a saúde, ou melhor, a assistência médica,  é dever do Estado e direito de todos, bem como a necessidade de um eficaz saneamento básico, pois é fato conhecido de todos que um real investido na prevenção poupa  muitos reais consumidos na medicina curativa. E nosso diagnóstico, como economista, é assustador. O cidadão paga tributos a nível federal, estadual e municipal para que o Setor Público cumpra sua missão. E, infelizmente, constatamos reinar o caos na área. Há hospitais federais, estaduais e municipais com tarefas e regiões superpostas e a população cada vez mais abandonada.

              Como já vimos, recursos existem, se bem que insuficientes. Só em CPMF, no ano de 2003, a previsão é de arrecadação da ordem de R$ 20 bilhões. Mas não chegam ao destino final, sendo desviados para outras funções ou mal geridos, provocando desperdícios ou sendo desviados nas redes de corrupção. E a população, insegura, corre atrás de planos de medicina de grupo ou seguro-saúde, alguns revelando-se verdadeiras "arapucas" e a maior parte apenas interessada em maximizar seus lucros. A maioria dos profissionais de saúde, na área pública, é mal remunerada, apesar de sua capacidade, enquanto uma minoria, composta de "marajás" do setor privado, enriquecem numa associação espúria, canalizando pacientes para suas clínicas particulares, desde que os rendimentos sejam elevados e deixando o paciente       de alto custo na rede pública, muitos dos quais associados destes famigerados planos, sem que haja ressarcimento ao Estado dos custos do tratamento.

              A solução passa pela clara delimitação de responsabilidades, com adequados orçamentos, pelas três esferas de poder. No plano federal, a responsabilidade pelo saneamento básico, pela prevenção das endemias, pela coordenação geral das atividades médicas empreendidas pelos estados e municípios. Na esfera estadual, o dever de manter hospitais de maior especificidade para atender aos problemas crônicos, de maior nível de especialização, demandando internações maiores. Aos municípios, além do reforço às funções anteriores, a responsabilidade pelo atendimento ambulatorial, a triagem, o restabelecimento do médico de família. Todos os profissionais bem remunerados, com treinamento adequado, recursos compatíveis, instalações dignas e o tratamento indicado assegurado (inclusive medicamentos e exames). Todo paciente com o direito de ser dignamente atendido, com o ressarcimento pelos planos particulares dos tratamentos efetuados, quando o paciente for associado a um deles. Assim, haverá recursos e todos serão atendidos pela rede pública dignamente. Quem tiver recursos de sobra, e assim o desejar, que procure os "medalhões". Na medicina verdadeira não há lugar para o mercantilismo. Quem o quiser, que deixe de exercer a nobre profissão e abra um cassino.

              Agora, percebe-se claramente o progressivo sucateamento da rede pública, o desprezo por seus profissionais, numa clara preparação da privatização total do setor. Os planos particulares já possuem mais de 20 milhões de associados. Falta-lhes apenas os hospitais. E o planejamento dos "mercantilistas" da saúde é justamente este. Tornar os hospitais públicos inviáveis para comprá-los a preços vis, tornando-se assim possuidores deste vasto patrimônio, construído com recursos de toda a população que, como sempre, será esbulhada.

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