O INSTITUTO DA ENFITEUSE  E A ATUAL ADMINISTRAÇÃO

Prof. Marcos Coimbra

Artigo publicado em setembro/2003 no jornal Ombro a Ombro

 

O líder do governo da atual administração Lula no Senado, Aloizio Mercadante, acaba de pronunciar-se contrário ao fim do instituto da enfiteuse no Brasil, em nome do "interesse econômico da União" e da "necessidade de se manter elevados superávits primários para garantir a confiança na capacidade de o governo honrar os seus compromissos impede que a União abra mão, neste momento, dos recursos arrecadados com as receitas patrimoniais". Na melhor tradição monetarista, S. Exª subordina fins a meios. De início, a atual administração Lula está cumprindo seus compromissos, engajadamente, com os banqueiros e as multinacionais, mas não com os trabalhadores, a exemplo da Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco Brasil (PREVI), onde os beneficiários, que teriam direito ao reajuste de 30,05%, em junho do corrente ano, obtiveram apenas 18%, a pretexto de se evitar déficit pelo terceiro ano consecutivo. S. Exª conhece muito bem os prejuízos ocasionados à PREVI em função de sua utilização no processo de privatização selvagem de estatais brasileiras, como no crime de lesa pátria da "doação" da Companhia Vale do Rio Doce, por influência de políticos com poder na administração anterior, mesmo sendo de "oposição". Para diminuir o déficit nominal do Tesouro não é preciso a utilização das receitas oriundas da enfiteuse, mas sim diminuir o extorsivo pagamento de juros exorbitantes da dívida pública, da corrupção desenfreada e do empreguismo utilizado  pela tomada de assalto pelas políticas clientelistas da nova administração, atingindo até o INCA. As "reformas previdenciária e tributária" são outras demonstrações de "ajustes fiscais", que provocarão perdas irreparáveis à classe trabalhadora, em especial à classe média, para alegria dos rentistas e do FMI.

      A outra linha de argumentação exposta por S. Exª, quanto à propriedade de terras brasileiras, leva ao raciocínio absurdo de que então não existe mais propriedade privada no Brasil. Na realidade, tudo deveria pertencer à União. Tal, contudo, não ocorre. Por que só as chamadas "terras da Marinha"? De fato, quem recolhe o foro e o laudêmio é o Serviço de Patrimônio da União, subordinado ao Ministério do Planejamento, atualmente com suas direções regionais entregues, no loteamento de cargos para garantir a maioria no Congresso, a um partido político, com grande influência religiosa, sempre presente em todos os governos, cabendo à Marinha, caso receba, irrisória fatia da arrecadação. Sob o ponto de vista da justiça e sob o aspecto ético, não há razão para a manutenção no anacrônico instituto, de origem medieval, capaz de permitir até à família imperial brasileira, em Petrópolis, arrecadação permanente, bem como a outras instituições privadas e religiosas.

      Não conseguimos descobrir a importância estratégica na segurança e soberania nacionais, em pleno século XXI, na era dos mísseis intercontinentais, de áreas costeiras. Não há porque   serem de propriedade da União, por esta razão. É um argumento sem fundamento. Quanto à preservação ecológica  e do meio ambiente, as condições atuais das citadas regiões como, por exemplo, a triste situação da baía de Guanabara mostra, à saciedade, o abandono a que estão submetidas, "sob a proteção da União". A hipótese, então, destes "terrenos para instalação de unidades militares" está fora da realidade, sabendo-se que a prioridade um da estratégia nacional  é a de ocupar a Amazônia, não havendo sentido na manutenção de organizações militares na costa, pois as existentes, por falta de utilidade, estão sendo transformadas em museus, centros culturais e outras.

      Os títulos fraudulentos e os aterros criminosos existem, apesar de serem de propriedade da União, e vão continuar existir, sejam ou não de sua propriedade. A solução está no cumprimento da legislação vigente para qualquer parte do território nacional. Portanto, não há justificativa racional para a manutenção do instituto da enfiteuse no Brasil.

Professor Titular de Economia junto à Universidade Candido Mendes, Professor na UERJ e Conselheiro da ESG.

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