HECATOMBES, LOGÍSTICA E MOBILIZAÇÃO

Prof. Marcos Coimbra

Conselheiro Diretor do CEBRES, Titular da Academia Brasileira de Defesa, da Academia Nacional de Economia e autor do livro Brasil Soberano.

(Artigo  publicado em 03.02.11 para o MM)

         A recente hecatombe ocorrida na região serrana do Estado do Rio de Janeiro, infelizmente, é um exemplo clássico de crônica de uma morte anunciada. Qualquer cidadão fluminense, com um mínimo de discernimento, sabe que, nesta época do ano, vai ocorrer algo semelhante. No ano passado foi Angra o destaque negativo. No ano vindouro será que município ou região? Não sabemos, mas temos a convicção de que sérios problemas ocorrerão em alguma parte do Estado. Ora, é impossível controlar as forças da natureza, porém é dever do Estado, em suas três esferas de atuação, prevenir, em primeiro lugar, e socorrer em tempo hábil, com eficiência e eficácia, as populações e áreas atingidas, o que não está sendo realizado.

         Existe no Brasil o Sistema Nacional de Mobilização (SINAMOB), criado pela Lei  11.631/2007 e regulamentado pelo Decreto 6.592/2008 (endereço eletrônico: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Decreto/D6592.htm).

Seu propósito é: A Mobilização Nacional conceituada no art. 2o da Lei no 11.631, de 2007, é a medida decretada pelo Presidente da República, em caso de agressão estrangeira, visando à obtenção imediata de recursos e meios para a implementação das ações que a Logística Nacional não possa suprir, segundo os procedimentos habituais, bem como de outras necessidades. A coordenação é do ministério da Defesa.

Também há o Sistema Nacional de Defesa Civil - SINDEC, sobre o reconhecimento de situação de emergência e estado de calamidade pública, sobre as transferências de recursos para ações de socorro, assistência às vítimas, restabelecimento de serviços essenciais e reconstrução nas áreas atingidas por desastre, de acordo com o  Decreto nº 7.257, de 4  de agosto de 2010. A coordenação é do ministério da Integração Nacional.

Ora, é evidente que o SINDEC não está funcionando a contento. Aliás, o governador do Rio de Janeiro estava fora do país, quando houve a catástrofe, tendo que retornar de imediato, talvez devido à decisão da presidente de visitar o local no dia seguinte. Esperamos que o SINAMOB funcione melhor, pois em caso negativo as consequências serão ainda mais dramáticas.

A título de sugestão preliminar, partindo da premissa de que o SINAMOB  efetivamente seja mais confiável, por que não aproveitar a estrutura dele, ampliando o seu raio de ação também para fatores adversos, além do enfrentamento do universo antagônico? Abaixo, apresentamos alguns adendos que podem ser feitos na doutrina existente, sujeita a maiores adaptações, precedido das devidas alterações na legislação em vigor, pois, na prática, as Forças Armadas é que possuem a estrutura e disposição necessárias para enfrentar os problemas.

         Antes de tudo é importante identificarmos os recursos existentes, usando a Logística, conjunto das atividades relativas à previsão e à provisão de todos os meios necessários à realização do atendimento de calamidades públicas  ou de guerra, bem como a Logística Nacional, conjunto de atividades relativas à previsão e à provisão dos recursos necessários à realização das ações planejadas para a Estratégia Nacional. A Logística Nacional atua apoiando ações estratégicas relacionadas a fatores adversos (desenvolvimento) e em oposição a pressões (segurança), dentro dos recursos do poder nacional. Suas principais características são: 1 - suas atividades são permanentes, existindo tanto em situação de normalidade, em apoio às ações correntes, como em apoio às ações de emergência; 2 - seu planejamento requer dinamismo e flexibilidade para se adaptar às mutações decorrentes das variações dos meios necessários à execução das ações estratégicas. As operações relativas às atividades logísticas compreendem três fases que se entrelaçam de maneira variável: determinação das necessidades, obtenção e distribuição. Quando os recursos da Logística forem insuficientes para atender às necessidades excepcionais existentes, ela pode ser complementada pela decretação de uma Mobilização, prevista na Constituição Federal (artigo 22, XXVIII).

         A Mobilização Nacional é o conjunto de atividades planejadas, empreendidas ou orientadas pelo Estado, complementando a Logística Nacional, para capacitar o poder nacional a realizar ações estratégicas de atendimento a calamidades públicas e de defesa (em face da declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira). A Mobilização efetua transferências de recursos para as expressões do poder nacional necessitadas ou para o  campo da segurança, inclusive agindo sobre o potencial nacional, podendo estas transferências processar-se entre: os campos do desenvolvimento e  da segurança, as expressões do poder nacional e os vários elementos constitutivos de uma mesma expressão do poder nacional. São duas as fases da Mobilização Nacional: preparo e execução. O Preparo da Mobilização Nacional caracteriza-se pelo conjunto de atividades planejadas, empreendidas ou orientadas pelo Estado, desde a situação normal, visando a facilitar a Execução da Mobilização Nacional. O Brasil, embora não conte normalmente com todos os recursos necessários, deve estar preparado para enfrentar  uma hecatombe ou  uma hipótese de guerra. A Execução da Mobilização Nacional é o conjunto de atividades que, depois de decretada a Mobilização, é empreendido pelo Estado, de modo acelerado e compulsório, a fim de transferir meios existentes no poder nacional e promover a produção e obtenção oportuna de meios adicionais. Neste estágio é importante conhecermos a capacidade de mobilização,  o grau de aptidão que tem uma nação de, em tempo oportuno, passar de uma situação de normalidade para uma de emergência, ou de paz para a guerra, com o máximo de eficácia e o mínimo de transtornos para a vida nacional. Cabe ressaltar que providências tomadas em uma das expressões têm sempre reflexos e conseqüências nas demais.

         Atenuados os motivos que determinaram a execução da mobilização, o país deverá retornar à condição de normalidade. Surge então a Desmobilização Nacional, conjunto de atividades planejadas, empreendidas ou orientadas pelo Estado visando ao retorno gradativo da nação à situação normal, uma vez cessados ou reduzidos em sua intensidade os motivos determinantes da Execução da Mobilização Nacional. Divide-se em duas fases: preparo e execução. O Preparo caracteriza-se pelo conjunto de atividades planejadas pelo Estado, desde a situação de normalidade, visando a facilitar a Execução da Desmobilização Nacional. A Execução é o conjunto de atividades que, em face da iminência ou efetivação do término da situação ou do conflito que determinou a Execução da Mobilização Nacional, é empreendido ou orientado pelo Estado, a fim de promover o retorno gradativo do país à situação de normalidade. A característica marcante da Desmobilização é a sua gradatividade.

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