DESCRENÇA NAS ELEIÇÕES

Prof. Marcos Coimbra

Professor Titular de Economia na Universidade Candido Mendes, Professor aposentado  na UERJ e Conselheiro da ESG.

Artigo publicado em 24.06.04 no MM

 

       Não acreditamos mais em eleições livres e democráticas no Brasil, pelo menos na conjuntura atual. O quarteto  "poder econômico- institutos de pesquisa- veículos de comunicação- eleição eletrônica" não nos permite acreditar. Não é necessário haver eleição, nem apuração para conhecer os resultados, em termos gerais. O que está em jogo na realidade é a disputa para os cargos não majoritários. No ano em curso, quem serão os novos vereadores, no lugar dos que não irão candidatar-se, por alguma razão.

       Os municípios estão em ebulição com a eclosão da campanha eleitoral para prefeito e vereadores. Está em plena vigência a possibilidade de recandidatura dos atuais detentores do poder municipal, sabiamente alcunhada de reeleição, pelo povo, pois é muito difícil um prefeito no exercício do cargo, sem necessidade de pedir licença ou desincompatibilizar-se, com pleno domínio da máquina administrativa, perder a eleição. Recursos financeiros, escassos para os outros candidatos, são abundantes para os que estão no poder. As empreiteiras e fornecedoras dos órgãos municipais são pródigas em concessão de doações aos atuais prefeitos, interessadas em ganhar licitações e concorrências milionárias, hoje e na expectativa do amanhã. São ainda milhares de cargos em confiança, ao dispor de S. Exa.. Os comissionados sabem que perderão seus cargos, caso não apoiem a sua postulação a permanecer no cargo. E a legislação eleitoral é tão rígida que obriga qualquer servidor público a afastar-se do cargo, noventa dias antes do pleito, para evitar a possibilidade de utilização do cargo para influenciar eleitores. Agora, com a aprovação da emenda constitucional que permite a recandidatura, o presidente da República, os governadores e os prefeitos podem permanecer em seus cargos. E o limite que separa a atuação lícita do prefeito, por exemplo, e sua ação como candidato é tênue. E a justiça eleitoral fica em dúvida, pois ela aplica a lei formulada pelo Congresso que é, propositadamente, omissa. Na dúvida, quase tudo é permitido.

       E a atuação da mídia também é altamente preconceituosa. Há ligações  incestuosas entre proprietários de veículos de comunicação, bem como de editores, jornalistas e vários candidatos, em especial aqueles que estão no poder, com o privilégio de destinar verbas vultosas de propaganda e publicidade, da ordem de centenas de milhões de reais para quem desejar. Desta forma, basta acompanhar o noticiário diário das revistas, jornais e TV, para verificar quem apoia quem. Há candidatos que ocupam meia página, com direito a foto, todos os dias, com destaque para os atuais prefeitos. Outros aparecem de vez em quando. Os demais são candidatos secretos. Só aparecem quando é obrigatório ou para serem atacados.

       Assim, fecha-se um círculo vicioso. Os candidatos detentores de maiores recursos aparecem mais nos meios de comunicação e na propaganda eleitoral. Os "outdoors" são democraticamente sorteados, porém quem não tem recursos próprios ou dos empresários, não consegue pagar seu aluguel, sendo obrigado a abrir mão deles para os abastados, que acabam ficando com todos. A seguir, os institutos de pesquisa, realizando seu mister, apuram o óbvio, isto é percentuais maiores para os "riquinhos" e menores para os demais, as vezes nem citados, ou mencionados com percentuais ínfimos. Como a maioria das pesquisas é paga justamente pelos que possuem recursos em abundância, as diferenças são acentuadas. O povo, geralmente, não aprecia votar em candidato que não tem condições de vencer, votando nos que estão na frente nas pesquisas, fechando-se o círculo vicioso, não virtuoso.

       O horário gratuito eleitoral também não é igualitário. O tempo destinado aos candidatos a prefeito é calculado em função da bancada federal de cada partido, não no dia da promulgação do resultado, mas sim numa data aleatoriamente escolhida pelos políticos, de acordo com sua conveniência. E as alianças eleitorais, por milhões de razões, nem sempre as mais éticas, proporcionam a alguns candidatos  mais de sete minutos. A outros, pouco mais de 30 segundos, por dia de apresentação. Os debates são desprezados pelos candidatos que estão na dianteira, com medo de mostrar sua fragilidade e cair nas pesquisas. São as regras do jogo impostas pelos oligarcas no poder.

       No Rio de Janeiro, já está decidido, antes da realização das convenções, que os candidatos reais são o atual prefeito Cesar Maia, que deverá ser reeleito, com a máquina da prefeitura nas mãos, os candidatos das máquinas estadual e federal, respectivamente, Srs. Luiz Paulo Conde e Jorge Bittar e o candidato da Igreja Universal, senador Marcelo Crivella. A coadjuvante será a deputada federal Jandira Feghali, por pertencer a um partido comunista tradicional, o PC do B. Os outros candidatos não contam. Inclusive já aconteceram reuniões com as principais emissoras de TV para acertar as regras dos debates e mais uma vez a legislação não vai ser cumprida. Os debates só serão realizados, em um mesmo dia, para os candidatos "preferenciais". O resto vai para outro dia. E chamam a isto de democracia!

 Em cada município, não é difícil prever o que vai acontecer. É a perpetuação no poder, que se passa ao longo de gerações, de pai para filho. E chamam a isto de democracia! Como sair disto e conseguir obter uma verdadeira democracia? Surpresas acontecem, mas constituem exceções.

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