A PERIGOSA SITUAÇÃO DA ARGENTINA

Artigo Publicado em 01/2002 no Ombro a Ombro.

 

         Conforme, infelizmente, já havíamos escrito em artigos anteriores, antecipamos a perigosa encruzilhada a que chegou a nação Argentina, na virada do ano. Desde 1989, em particular com a ascensão ao poder do ex-presidente Carlos Menem e do seu auxiliar, o representante dos "donos do mundo", o ex-ministro Domingo Cavallo, os argentinos seguem rigidamente o receituário neoliberal, imposto pelos arautos da globalização. O patrimônio nacional  do outrora rico país foi dilapidado. Hoje, de significativo, só restou o Banco de La Nacion. E a dívida continua a crescer, função da elevada taxa de juros praticada pelos banqueiros. A pobreza aumenta, já atingindo mais de uma dezena de milhões de argentinos. A miséria campeia. O desemprego ultrapassa 20% da população economicamente ativa.

         No afã de satisfazer o apetite insaciável dos "donos do mundo" o facínora Cavallo cortou duro na carne do povo argentino, na tentativa vã de apresentar superávits fiscais e de pagar juros vultosos aos banqueiros internacionais. Feriu primeiro os aposentados e pensionistas, cortando-lhes parte dos seus rendimentos. A seguir, partiu para o inimaginável, limitando o saque a 250 pesos semanais e a um mil pesos mensais. O povo, justamente revoltado, foi às ruas. E, após dezenas de mortos, centenas de feridos e prisioneiros, derrubou a administração inimiga. De fato, o ex-presidente De La Rúa foi eleito em oposição a Menem, justamente como alternativa de poder antagônico ao entreguismo praticado até então. Como não foi capaz de apresentar um modelo alternativo, buscou ajuda justamente no chefe da "quadrilha", ou seja, em Cavallo, o pai da implantação na Argentina do receituário do FMI, bem como do regime de câmbio fixo, no qual o peso tem valor igual ao dólar.

         E, é oportuno lembrar, os indicadores sócio-econômicos  argentinos s/ao bem superiores aos do Brasil (renda per capta superior ao dobro; índice de 70% de acesso a remédios básicos contra apenas 40% no Brasil; tempo em média de estudo de 8,8 anos contra menos  de 5 anos em nosso país; índice de desenvolvimento humano da ONU em 34o lugar, enquanto o Brasil de FHC alcançou o 69o lugar). Porém, quando sentiram o empobrecimento progressivo sofrido, em função da política de arrocho, protestaram e derrubaram também   o governo provisório de Rodriguez Sáa. O impasse é sério. Apesar das tentativas golpistas do grupo do ex-presidente Menem de escolher um fantoche com mandato até 2003, em eleições indiretas, acaba de ser escolhido o ex-governador Eduardo Duhalde, da ala nacionalista do partido peronista. Entretanto, o povo exige eleições diretas, sem subterfúgios, para legitimar o novo primeiro mandatário. Parece que o bravo povo argentino procura outras opções, cansado como o nosso, de tanta corrupção, entreguismo, manipulação e falsas oposições, que, quando assumem o poder, procedem de forma idêntica aos antigos detentores do poder político. Oxalá o povo argentino reencontre o caminho do progresso, restabelecendo seus antigos valores.

         Fica o alerta para nós. Por muito menos, os argentinos já derrubaram dois governos. Até um superávit comercial de US$ 1 bilhão a Argentina obteve do Brasil em 2001. A concentração populacional argentina na capital, Buenos Aires, facilita a participação  ativa da população no processo político, enquanto que a mudança do Rio para Brasília, funciona como fator desmobilizador. Afinal, tudo tem limite.

Prof. Marcos Coimbra

Professor Titular de Economia junto à Universidade Candido Mendes, Professor na Uerj e Conselheiro da ESG

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